Serão investidos R$ 600 milhões para melhorar balneabilidade no Litoral Norte

Serão investidos R$ 600 milhões para melhorar balneabilidade no Litoral Norte

Recursos da Corsan Aegea são para cumprir Marco Legal do Saneamento Básico até 2033

Rodrigo Thiel

A obra em Xangri-Lá faz parte de projeto do Grupo Aegea

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A colocação de uma nova tubulação levará o esgoto tratado de Xangri-Lá para o rio Tramandaí, no Litoral Norte. A obra tem previsão de conclusão em novembro deste ano, com investimento de R$ 21 milhões, mas não será a única a ser realizada até 2033, quando encerra o período de ajustes para o Marco Legal do Saneamento Básico. Até lá, 90% da população precisa ter acesso ao tratamento e à coleta de esgoto. Para isso, a Corsan Aegea prevê um investimento de R$ 600 milhões na região.

A obra de Xangri-Lá, porém, enfrenta resistências de parte da população, que afirma que a obra vai contaminar o rio Tramandaí com mais dejetos. O diretor Regional de Operações do Litoral Norte, Fábio Arruda, garantiu que, após concluídas todas as obras, o Litoral Norte não terá problemas com balneabilidade, além de ter uma estrutura que fomentará o desenvolvimento econômico e imobiliário na região.

“Desde que assumimos, em julho de 2023, colocamos um foco muito grande nas obras no Litoral Norte. Refizemos alguns projetos executivos, reforçamos o time de licenciamento ambiental para conseguir licenças no prazo e agora iniciamos as obras de ampliação do sistema. Essa obra (do emissário) permite a liberação de obras de infraestrutura no litoral e destrava as construções. Depois deste investimento de R$ 600 milhões, teremos uma infraestrutura completa para que não haja problemas com balneabilidade de Mostardas a Torres”, apontou Arruda.

O diretor citou ainda o crescimento de todas as cidades da região como um fato que justifica o investimento que será feito pela companhia. Segundo ele, em 2024 serão aplicados R$ 85 milhões em melhorias de estações, expansão de rede e novos emissários. “Muito provavelmente estas são as cidades que mais crescem no RS. Se a gente não acompanhar isso com tratamento de esgoto agora, vamos ter um grande problema no futuro. O que estamos fazendo é justamente trabalhar para que o saneamento básico acompanhe o desenvolvimento econômico”, completou.

No início de março, representantes da Aegea já haviam abordado este tema na apresentação de um balanço dos primeiros meses da empresa à frente da Corsan para o governador Eduardo Leite. Na oportunidade, o vice-presidente regional Sul da Aegea, Leandro Marin, disse que as intervenções realizadas permitiram a liberação de habite-se para mais de 2 mil imóveis de Capão da Canoa e Xangri-Lá que estavam emperrados. “Em termos de infraestrutura, teremos um salto gigante se comparado com o litoral de SC. E isso reflete na balneabilidade das praias a partir do tratamento do esgoto”, falou Marin.

Desenvolvimento imobiliário

Autoridades locais aprovaram o início das obras e preveem que estes investimentos reflitam diretamente no desenvolvimento imobiliário do Litoral Norte. O prefeito de Xangri-Lá, Celso Bassani Barbosa, afirmou que o emissário e as melhorias feitas pela Corsan levarão a uma retomada da economia voltada ao setor da construção civil. “Agora, Xangri-Lá não para mais, não trancam mais obras, nem alvarás. Com certeza, o nosso município viverá uma nova etapa de desenvolvimento”, projetou o prefeito.

Quem também aprovou a obra foi o vice-presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), Alfredo Pessi, responsável pelo Escritório Regional Litoral Norte da entidade. Segundo ele, até dezembro de 2023, foram quase cinco anos sem liberação de alvará para novas construções em Capão da Canoa e Xangri-Lá.

“O investimento é importante para o desenvolvimento sustentável da região como um todo. Com a modernização do sistema e dos equipamentos para o tratamento de esgoto também diminui o desabastecimento e abre espaço para expansão econômica, incluindo a imobiliária que estava travada. Os ganhos são sociais, econômicos e ambientais”, apontou.

Para Pessi, o investimento será fundamental para o crescimento ordenado da região. “Nosso Litoral tem se tornado residência fixa de um perfil de morador em idade ativa, que se mudou para região em busca de qualidade de vida para sua família. Só a população de Capão da Canoa cresceu mais de 50%, segundo o último censo, trazendo investimentos. Precisamos garantir o desenvolvimento desses municípios de forma ordenada e os investimentos em saneamento são parte fundamental deste planejamento”, completou.

Impactos do emissário no rio Tramandaí

O emissário que está sendo construído será responsável pela destinação do esgoto da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) II, que atende Xangri-Lá, até um local chamado de “Ponto 3” do rio Tramandaí, localizado em Osório. O descarte deste material na bacia do rio causou discussões em redes sociais, principalmente relacionada com as garantias da qualidade do esgoto que será lançado.

Próximo ao “Ponto 3”, muitas famílias utilizam o rio para pescar. Inicialmente, o emissário descartará esgoto de Xangri-Lá no ponto 3 do rio Tramandaí, mas a previsão é de que novas obras permitam que o resíduo de Capão da Canoa também seja destinado para o local até 2030. Entretanto, o diretor Fabio Arruda garante que todo o esgoto chegará tratado ao rio Tramandaí.

“O efluente é tratado com 95% de eficiência na remoção de carga orgânica. Hoje, o nosso Centro de Operações Integrada monitora 24 horas por dia o tratamento do esgoto do litoral. Esse foi um dos primeiros passos que a gente deu, pois precisamos dar garantia do efluente que será lançado no rio, conforme pede a legislação ambiental”, afirmou.

Arruda falou ainda do tipo de tratamento utilizado no Litoral Norte. “As estações de tratamento do litoral possuem o que há de melhor de tecnologia em relação ao tratamento de esgoto. Elas são diferentes, por exemplo, da ETE Freeway, que fica em Cachoeirinha, pois usam um sistema de injeção de oxigênio. São equipamentos robustos e de alta potência que injetam o oxigênio no esgoto para garantir que essa eficiência seja atendida”, acrescentou.

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Procurado, o Centro de Estudos Costeiros, Limnológicos e Marinhos (Ceclimar) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), que está localizado na beira do rio Tramandaí, em Imbé, afirmou que não foi consultado quanto ao lançamento de efluentes. Entretanto, o Ceclimar é membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Tramandaí (BHRT).

Conforme a pesquisadora do Ceclimar, Cacinele Mariana da Rocha, dados produzidos em estudos muito antes do início da obra já demonstram redução na qualidade das águas da bacia. “Cada vez mais frequentes são as situações de florações de algas, condição que demonstra o comprometimento do recurso hídrico, e há perspectiva de piora se não forem revistos alguns usos. Essa condição já afeta os usuários da água, sem distinção”, citou.

Cacinele também falou sobre os tipos de componentes químicos e biológicos que podem ser descartados através do emissário. Segundo ela, mesmo com o tratamento, ainda podem estar contidos alguns contaminantes descartados por residências e indústrias, como medicamentos, entre eles antibióticos e anti-inflamatórios, hormônios, anticoncepcionais, inseticidas, pesticidas, estimulantes, microplásticos e metais pesados.

“Considerando um tratamento terciário, tido como melhor tratamento, seriam retirados materiais em suspensão, matéria orgânica, nutrientes e patógenos. Contudo, como isso ocorre com eficiência aproximada de 90 %, parte destes contaminantes ainda seriam descartados nas águas. Faltam estudos para melhor compreender os impactos, mas se acredita que haverá impactos visto que a inserção de qualquer componente diferente tem potencial de modificar o ambiente natural”, ressaltou a pesquisadora.

O presidente do comitê da Bacia do rio Tramandaí, o ecólogo Dilton de Castro, aponta que mais de 60% da população do Litoral Norte não tem um sistema adequado de esgoto. Para ele, isso acaba se intensificando com o aumento de moradores fixos na região. “Parte do que se tem atualmente é fossa e sumidouro, o que acaba contaminando o lençol freático, especialmente na orla, pela areia. A população está crescendo aqui. Depois da pandemia, teve um incremento maior ainda. Mas a infraestrutura urbana e o saneamento básico não acompanharam esse crescimento”, citou.

Castro falou ainda que o cenário ideal seria a construção de um emissário que destinasse o resíduo tratado até um ponto mais profundo do oceano, mas que esse tipo de obra teria um custo muito elevado. “O que se tem é uma preocupação grande oriunda no desconhecimento sobre o lançamento de esgoto. Até porque não vai ser lançado esgoto nenhum, mas sim lançado o efluente tratado. Mas a bacia do rio Tramandaí, com lagoas costeiras, cuja capacidade de apuração é diferente de um rio corrente, é um sistema mais delicado e mais fácil de entrar em colapso”, completou.

A licença ambiental para a obra foi emitida pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) em outubro de 2023. Em nota, o órgão informou que “a medida busca ampliar a capacidade de tratamento de esgotos domésticos da região. O empreendimento licenciado prevê o lançamento de efluentes tratados, dentro dos padrões pré-determinados pela Resolução Consema nº 355/2017. O documento, emitido pela Fepam após análise técnica, elenca uma série de condicionantes, entre elas a determinação de pontos de monitoramento da qualidade da água no rio e entorno”.


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