Entidades e deputados de oposição relatam insegurança com concessão do Cais Mauá

Entidades e deputados de oposição relatam insegurança com concessão do Cais Mauá

Além do receio quanto às alterações no ponto histórico, há também um temor em função do edital e do consórcio vencedor do leilão

Correio do Povo

Consórcio Pulsa RS arrematou o Cais Mauá por R$ 144,8 milhões, com a concessão do espaço por 30 anos e previsão de investimentos na revitalização do ponto histórico de Porto Alegre

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A retirada de um muro que se mostrou eficiente no combate à enchente. A possível descaracterização de um espaço histórico para Porto Alegre e para o Rio Grande do Sul, com a construção de prédios e o aumento no fluxo de veículos. E um edital considerado frágil por parte de entidades defensoras do patrimônio histórico e cultural e de deputados estaduais. Tudo isto geral insegurança para um grupo de organizações e políticos gaúchos sobre a venda do Cais Mauá.

No dia seguinte ao leilão, realizado na bolsa de valores B3, em São Paulo, no dia 6 de fevereiro, um grupo de deputados estaduais esteve no Ministério Público de Contas (MPC) para entregar um requerimento solicitando medida cautelar de urgência para que o Governo do Estado se abstenha de assinar contrato com o Consórcio Pulsa RS, único participante do certame. Uma das presentes no encontro era a deputada Sofia Cavedon, que apontou este como mais uma concessão eivada de irregularidades e inseguranças.

“Impetramos vários questionamentos no período propício que tratavam da solução do Muro (da Mauá), considerando as cheias nas quais ele se mostrou tão necessário, além da solução viária, pois o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) apontou que o projeto indica a entrada de milhares de veículos pela avenida Sepúlveda e pelo Pórtico Central, e isso abala as estruturas que são tombadas. Também há a permissão do uso de armazéns em caso de alternativas viárias. Ou seja, contrapartidas mitigadoras serão financiadas pelo patrimônio público”, relatou.

Sofia citou também que existem outras “questões estranhas”. “Foi apenas um interessado, com um patrimônio superbaixo, com uma mudança de endereço no período em que mais uma vez foi prorrogada a licitação ou a abertura do leilão. Então há muita insegurança. Levamos tudo isso ao MPC. Nosso medo é de que poderá se repetir o erro anterior, de ter feito a concessão para um fundo que não tinha recursos e acabanou abandonando a obra”, completou.

A advogada Jacqueline Custódio, especialista em preservação do patrimônio público e coordenadora do Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro em Porto Alegre, também participou do encontro no MPC. “Tendo em vista toda essa experiência que a gente teve, nos assusta muito ter um consórcio que ninguém sabe nada e que não tem um histórico de trabalho no setor. Aparentemente não tem as garantias, como outro não tinha também. Fica difícil entender porquê o governo não consegue dialogar com a gente. Fica nos perguntando porquê a gente tem que seguir esse caminho de novo, um caminho que já deu errado uma vez”, citou.

Jacqueline também citou os principais pontos de atenção, segundo ela, no projeto apresentado pelo governo. Para ela, o Muro da Mauá e a ocupação do Cais para residências, escritórios e comércios podem causar danos ao espaço histórico. “Em relação ao muro, eles propõem uma proteção móvel a partir de uma mureta de 1 metro na frente dos armazéns, algo que a diretriz do Iphan não permite. Em relação aos prédios, além de alterar o visual, ainda terá muita gente indo morar ali, com um ou dois carros por família. Eles vão acessar por onde? O único lugar é pelo pórtico. Tecnicamente, me parece algo inviável”, apontou.

Em nota, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS), também se mostrou inseguro a partir do projeto divulgado pelo governo. “Acompanhamos com apreensão por se tratar de empreendimento em local que é cartão-postal da capital e toda e qualquer intervenção deve levar em conta a paisagem da cidade. Esperamos que o projeto seja uma construção com a população, o Cais merece toda a atenção da sociedade e dos órgãos de controle, para garantir o acesso público e uma preocupação com as questões ambientais”, disse a presidente Andréa Hamilton Ilha.

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Procurado sobre o requerimento encaminhado pelos deputados estaduais ao MPC, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) comunicou, através da sua área técnica, que aguarda o retorno do processo que está no MPC para retomar a análise da auditoria. “Por hora não temos como saber o teor dos argumentos apresentados, somente quando o processo retornar para auditoria, o que acredito aconteça ainda essa semana”, destacou em nota.

Governador Leite e prefeito Melo participaram do leilão do Cais Mauá realizado na B3, em São Paulo | Foto: Mateus Rausgaut / Prefeitura de Porto Alegre / Divulgação / CP

Garantias orçamentárias do consórcio serão apresentadas em até 60 dias após homologação

O consórcio Pulsa RS, única empresa habilitada no leilão do Cais Mauá, é formado pelas empresas Credlar Empreendimentos Imobiliários LTDA, com sede em Praia Grande-SP e com capital registrado em R$ 21 milhões, e pela Spar Participações e Desenvolvimento Imobiliário LTDA, que é sediada em Porto Alegre e possui um capital registrado de R$ 10 mil. Por ser um CNPJ inscrito como Microempresa (ME), a Spar possui um limite de renda bruta anual de R$ 360 mil. Por outro lado, a Credlar é uma das maiores construtoras do litoral paulista.

O consórcio arrematou o cais por R$ 144,8 milhões, com a concessão do espaço por 30 anos e investimentos na revitalização e qualificação do espaço. Conforme a Secretaria Estadual de Parcerias e Concessões, a concessão está em etapa de habilitação, onde os documentos apresentados pelo consórcio Pulsa RS no leilão estão sendo analisados. Após, a segunda etapa prevê a homologação da licitação, onde ocorre a confirmação de que o certame atendeu as normas legais previstas no edital e que está apto para a assinatura do contrato de concessão.

Apenas na terceira etapa, chamada de Período de Pré-Assinatura de Contrato, é que o consórcio deverá criar uma empresa de Sociedade de Propósito Específico (SPE) e apresentar garantias financeiras e seguros previstos no edital. Nesta etapa, além dos documentos do consórcio, da Credlar e da Spar, também deverão ser entregues as garantias de outras empresas que podem fazer parte do Pulsa RS.

Após tudo entregue e aprovado, o consórcio vencedor está apto para revisar os projetos, administrar e promover os investimentos no Cais Mauá. Ainda de acordo com a pasta, se o consórcio não apresentar provas de que pode assumir o espaço, deverá pagar ao Governo do Estado uma multa prevista no edital de 1% do investimento previsto, totalizando R$ 3,5 milhões.

Questionado, o consórcio Pulsa RS informou que a incorporadora Credlar buscará empresas de diferentes especialidades para fazer parte do grupo, e que os “parceiros atuarão no projeto conforme a vocação e a especialidade dos seus negócios”. Além disso, o consórcio destacou que as garantias financeiras exigidas serão apresentadas em até 60 dias depois da homologação da licitação.

O que diz o consórcio Pulsa RS

CP – Há alguma estimativa ou previsão de quando o consórcio deverá assumir a gestão da Cais e quanto deve investir inicialmente?

Pulsa RS – O processo de concessão do Cais Mauá à iniciativa privada segue os ritos do edital, que está em fase de avaliação da habilitação do consórcio. Depois dessa etapa, será constituída a Sociedade de Propósito Específico (SPE) e será assinado o contrato. Só então a SPE poderá fazer negócios com empresas interessadas em integrar a operação do Cais Mauá.

CP – Com relação à SPAR ter um limite de receita bruta anual de R$ 360 mil por ser ME, há algum indicativo de quando a Credlar deve aportar no consórcio para as garantias financeiras a serem apresentadas ao Governo do Estado quando constituída a sociedade de propósito específico (SPE)?

Pulsa RS – A garantia de fiel cumprimento (que é a garantia financeira exigida em edital como condição prévia à assinatura do contrato) será apresentada em até 60 dias após a homologação. A incorporadora CREDLAR é uma das empresas que compõem o Consórcio PULSA RS, que irá congregar empresas de diferentes especialidades, entre elas consultorias com ampla expertise em áreas portuárias.

CP – Há conversas para que outras empresas possam entrar também no consórcio, principalmente marcas gaúchas? Quantas empresas devem participar, ao todo, do consórcio após a constituição da SPE?

Pulsa RS – A Sociedade de Propósito Específico a ser constituída pelo Consórcio viabiliza a participação de um grupo de empresas engajadas no desenvolvimento do Rio Grande do Sul, além de companhias nacionais interessadas no fomento das atividades econômicas na região. O empreendimento inovador devolverá o Cais Mauá à população e ampliará a qualidade de vida na cidade ao contemplar novas opções de cultura e lazer, entretenimento e gastronomia, além de uma série de outros serviços. Os parceiros atuarão no projeto conforme a vocação e a especialidade dos seus negócios.

CP – Ainda com relação à informação da recente troca de endereço no CNPJ da SPAR, está prevista mais uma mudança, principalmente na constituição de um ponto físico para administrar as operações do consórcio?

Pulsa RS – O Consórcio Pulsa RS possui uma configuração jurídica que atende aos requisitos do edital. Cabe lembrar que a SPAR não é a única empresa integrante do Consórcio PULSA RS, que poderá contar com o apoio de parceiros financeiros, interessados, ou não, em ingressar na composição acionária da SPE a ser constituída. Cabe lembrar que o projeto do Cais Mauá será administrado por pessoa jurídica a ser constituída especificamente para este fim (sociedade de propósito específico), trazendo uma segregação contábil importante para a gestão do empreendimento e aumentando ainda mais sua governança para efeito de auditoria e prestação de contas tanto para os órgãos de controle quanto para a sociedade.

CP – Há algum indicativo de como funcionará a estrutura do consórcio? Se ele será administrado pela SPAR com as outras empresas atuando como investidoras?

Pulsa RS – O Consórcio Pulsa RS possui uma configuração jurídica que atende aos requisitos do edital e possibilita que outras empresas possam fazer negócios com a sociedade de propósito específico a ser constituída, seja integrando o seu quadro acionário, seja por meio de outros arranjos legais.

CP – Já há algum projeto ou encaminhamento das primeiras ações/obras/construções que serão realizadas no Cais?

Pulsa RS – O Consórcio Pulsa RS está focado no cumprimento das obrigações estabelecidas em edital para as etapas subsequentes, certo de que as instituições públicas competentes darão publicidade às informações do processo ao mercado e aos demais interessados no acompanhamento do projeto.


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DESDE 1º DE OUTUBRO 1895