Eduardo Leite: O homem que domina o pandeiro

Eduardo Leite: O homem que domina o pandeiro

Instrumento virou uma característica das campanhas políticas de Eduardo Leite

Mauren Xavier

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Após três anos e três meses vivendo em um Palácio, não por lazer mas pela facilidade de morar no trabalho, a atual morada tem sido dividida entre hotéis, o apartamento alugado e uma casa localizada no bairro Menino Deus, em Porto Alegre. Esse último é um local estratégico. É onde está a produtora da campanha, mas também serve para reuniões e de cenário para entrevistas e gravações. É nesse ambiente que a conversa começa. Apesar de uma inicial formalidade, Eduardo Leite (PSDB) faz as honras, oferece e serve café. O clima se altera logo após a primeira pergunta: afinal, quem é o Eduardo? 

Acomodado na cadeira e com um riso fácil, a resposta vem rápida. “É esse rapaz que está aqui há quase 20 anos na vida pública”, para em seguida citar o rol da sua trajetória política, que começou na disputa a vereador de Pelotas, aos 19 anos, e seguiu até o governo do Estado, posto que renunciou em março passado, mas ao qual pretende retornar no próximo ano, rompendo a tradição gaúcha de não reeleger um governador. 

Fora do currículo conhecido, Leite se resume como um sujeito simples e que gosta de estar com a família, que não é pequena, como ele mesmo ressalta. Para compreender isso, ele se debruça a contar a história da sua mãe, a professora Rosa Eliana. Natural de Santana da Boa Vista, ela veio de uma família humilde e grande, formada por dez irmãos. Naquela época, a localidade era um distrito de Caçapava do Sul, comenta ele apontando a localização no mapa do Rio Grande do Sul em sua mesa de trabalho. “Era uma família muito pobre e foi para Pelotas. Os pais da minha mãe morreram muito cedo. Então, moravam todos juntos, num apartamento de dois quartos. Toda a família, todos irmãos, os mais velhos cuidando dos mais jovens”, recorda. Essa união permaneceu e avançou nos anos seguintes, com o casamento e a chegada dos novos integrantes.

É dessa família que virá uma característica marcante na sua vida: a música. E a origem pode ser a genética mesmo. O pai, José Luiz Marasco Cavalheiro, sempre gostou de música e tocava acordeão ou gaita desde a infância e, inclusive, foi professor de violão do músico Kledir Ramil. E esse amor pela música acabou sendo repassada aos filhos Gabriel, Ricardo e Eduardo. No caso do mais jovem, antes de chegar ao pandeiro, ele passou por outros instrumentos. Na verdade, na infância estudou teoria musical, depois tentou tocar teclado. Após aulas e um braço quebrado, acabou migrando para o saxofone. Mas por influência de um dos irmãos, acabou aprendendo a tocar o pandeiro. A ideia era diversificar o instrumento em relação aos dois irmãos mais velhos, que já tocavam instrumentos. Gabriel, o irmão mais velho, toca violão, enquanto que Ricardo, o do meio, toca cavaquinho. Assim, sobrou o pandeiro para Eduardo, que se tornou sua marca registrada.

O instrumento musical, que vinha sendo conhecido apenas pelos pelotenses, quando ele tornou-se prefeito, viralizou na disputa ao governo do Estado, em 2018, quando puxou o pandeiro durante a campanha e, desde então, perpassou momentos importantes, como na disputa das prévias do ninho tucano à presidência da República e quando tentou ensinar algumas batucadas ao rei da Espanha, Filipe 6º, durante missão internacional ao país, ambos há um ano atrás. O gesto acabou pegando e, em alguns momentos, até o surpreende. “Às vezes as pessoas me entregam o pandeiro, como se fosse só tocar. Às vezes, nem combina com o ritmo da música”, ri. 

Mas não é só o samba que marca a trilha sonora do pelotense. A playlist no Spotify mostra bem esse perfil eclético. Na ponta dos dedos, vai percorrendo uma das pastas com mais de 300 músicas dos mais diversos gêneros musicais, passando por R.E.M, Dire Straits, chegando em Mart'nália e avançando para artistas mais recentes, como The Weeknd. Apesar disso, ao ser questionado sobre a primeira música que lhe vem à cabeça a escolhida é ‘Todo Se Transforma’, do uruguaio Jorge Drexler, com um trecho citado por ele: “Cada uno da lo que recibe / Y luego recibe lo que da / Nada es más simple / No hay otra norma / Nada se pierde / Todo se transforma”. A música tem valor afetivo. Foi a trilha que usou ao buscar o diploma na formatura no curso de Direito. Perguntado sobre se tudo realmente se transforma, a resposta vai direto: “Sim. E acho que devemos estar especialmente prontos para isso”. 

A combinação da música com uma grande família deu certo e quase fez nascer uma banda. Na verdade, informalmente, ela existe e marca presença nos encontros familiares, que não são poucos, mas a sua participação ficou mais limitada com o processo eleitoral. O ritmo de campanha também impactou em outros momentos de lazer, como o tempo com Bento e Chica, os cãezinhos de estimação que o acompanham nos últimos anos. Sem tempo de dar a atenção necessária, os cuidados com eles têm ficado a cargo de uma creche. Sobre eles, Leite recorda que foi indicação do ex-secretário de Fazenda Aod Cunha: “Ele é cachorreiro. E uma vez me disse: ‘Te recomendo ter um cachorro. Vais ter dias que tu vais estar cansado e tu vai querer ficar sozinho e o cachorro vai ser a companhia que vai fazer uma diferença pra ti’. Após isso, aceitei a recomendação”. Na verdade, acabou ganhando de presente, primeiro Bento, ainda no primeiro ano de mandato. Depois, veio Chica. Com os dois juntos, chegou a primeira ninhada. “Sempre me perguntam por eles”, comenta, sobre a abordagem constante de pessoas. “Uso a máxima de que eles me conhecem e que preciso retribuir”.

Essa aproximação não o incomoda, mas, com duas décadas na vida pública, Leite reconhece uma certa cautela com a exposição nos momentos de lazer. “Procuro ter uma programação normal, sair para jantar, encontrar com amigos. Mas tu estás sempre sobre os olhares das pessoas”, observa. Apesar disso, diz encontrar satisfação na vida pública. “Se por um lado consome, por outro, se estivesse do lado de fora, estaria angustiado por não estar participando”, admite.


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